Sílaba Kalachakra

Sílaba Kalachakra

As Três Naturezas

As três naturezas (trisvabhava), compreendem ensinamentos apresentados pela escola indiana Yogacara (séc. IV), adotados pela tradição Jonang-Zhalu, que dividem a compreensão das realidades relativas e última em três naturezas (as duas primeiras, relativas e a terceira, última): conceitual (parikalpita), dependente (paratantra) e Absoluta (Parinishpanna).

A)    Parinishpanna (Realidade Última):

Eterna, constante, imutável, incognoscível. O que a tradição Jonang-Zhalu chama de o Vazio de Outro ou Shentong. A essência indestrutível de todas as coisas; Natureza-Buddha ou Natureza Plenamente Estabelecida. Também chamada de Dharmata, só podendo ser alcançada pela compreensão direta e não-dual (jnana).

B)    Paratantra (realidade convencional)
 
Natureza dependente, relação com o funcionamento da mente em sua interação com os demais fenômenos. Há uma dependência entre a mente e o objeto para a formulação de um conceito; dependência do sujeito com o objeto para a formulação de uma ideia/conceito, constituindo uma verdade relativa, mas não última.

C)    Parikalpita (realidade convencional)

Ilusória, pensada, natureza imaginada. Aquilo que a mente (citta), contaminada   de tendências, projeta ou imputa sobre os objetos em sua interação com eles no         mundo fenomênico.
Nessa visão, o continuum mental (citta) não deve ser tomado como a medida última de todas as coisas, uma vez que ele próprio é um fluxo poluído com sementes de perturbações (klesha-avarana e jneyavarana) e um repositório de tendências (samksara) conscientes e inconscientes, que se ativam conforme causas e condições apropriadas.

Nem os objetos devem ser asseverados como meras projeções da mente, uma vez que estes, assim como a mente, também existem de forma relativa no mundo fenomênico e tais projeções/imputações contaminadas resultam dos mecanismos de apreensão da mente em sua interação com o mundo fenomênico por meio das seis consciências (vijnanas), isto é, os cinco sentidos físicos (tato, olfato etc) e o pensamento (manas).

Parinishpanna, portanto, está além dos domínios da mente (citta), sendo a própria base (Alaya) de tudo, não-dual, livre de contaminações como “um céu sem nuvens”, nas palavras de Dolpopa, enquanto a mente (também chamada de fluxo ou continuum mental) se refere a “um céu encoberto de nuvens”, a base contaminada da consciência dual (alaya-vijnana), poluída de obstruções.
Essa importante distinção, a ser abordada em outros textos, é um dos pontos fundamentais dos ensinamentos da tradição Jonang-Zhalu em seu esforço para corrigir equívocos acerca da filosofia Yogacara.

Texto escrito por Bruno Carlucci, 2016.