Sílaba Kalachakra

Sílaba Kalachakra

O Kalachakra

O Sistema Kalachakra

A tradição Jonang-Zhalu deu importante ênfase ao tantra Kalachakra, um sistema altamente complexo e avançado que sintetiza o budismo vajrayana, a filosofia mahayana e outras escolas indianas não budistas, elementos de cosmologia, cosmogonia, a gênese do cosmos externo (macrocosmo) e o funcionamento do “cosmos interno” (microcosmo).

Mandala Kalachakra


O termo Kalachakra significa Roda do Tempo (ou Círculo do Tempo) e tem como conceito básico a ideia de identidade do macrocosmo com o microcosmo, sendo que o texto Kalachakra raiz (de Suchandra) e o texto sintético (Laghu) de Manju Yashas tem 5 divisões: (1) Cosmologia (Kalachakra externo); (2) a relação corpo-mente (Kalachakra interno); 3) Ritos/Iniciações; 4) Práticas; 5) Textos de sabedoria (Jnana).

O Dharma Raja Suchandra, o Regente de Shambala, teria recebido os ensinamentos diretamente de Buddha Shakyamuni e elaborou o texto raiz. Posteriormente, Manju Yashas teria elaborado o Laghu Kalachakra, uma versão abreviada do texto raiz, no séc. I a.c., e Kalki Pundarika, é o autor do Vimalaprabha (a “Luz Imaculada”), um comentário ao Laghu. 

O Kalachakra se manteve um sistema tântrico reservado no Dharma idôneo da Índia, chegando ao Tibete no período das novas traduções (período sarma), com o surgimento do núcleo Kadampa original no séc. XI, dando origem às linhagens Dro e Ra, sendo esta última enfatizada na escola Sakya.   

As escolas Jonang e Zhalu, já no séc. XIV, realizaram um esforço de retradução e comentários dos textos Kalachakra, incluindo as linhagens Dro e Ra, apresentando o Kalachakra como um sistema ligado ao que Dolpopa Sherab Gyaltsen chama de Kritayuga Dharma (ou o Dharma da Era de Ouro), assim como os demais ensinamentos da tradição Jonang-Zhalu, estando em consonância com a visão Shentong. O termo AdiBuddha (Buddha Primordial), presente no Kalachakra, seria um outro sinônimo para Dharmata ou Realidade Última indestrutível.  

Importantes nomes ao longo da história dessa tradição, como Dolpopa Sherab Gyaltsen, Lotsawa Mati Panchen, Lotsawa Lodro Pal, Choskle Namgyal, Buston Rinpoche, Bodong Namgyal, Taranatha, dentre outros, se dedicaram a esses importantes ensinamentos.

Mesmo após o fechamento do núcleo Jonang no século XVII, o sistema Kalachakra continuava a ser praticado reservadamente por um discípulo de Taranatha e pela linhagem Gelugpa dos Panchen Lamas.

Sobre o Vajrayana

Cabe ressaltar que, como em qualquer tradição idônea do Dharma, os ensinamentos e práticas avançadas, vinculados ao tantra ou ao chamado Vajrayana (Veículo Adamantino - o veículo do tantra), eram reservados a praticantes avançados e com uma base e conduta ética conforme os ensinamentos estabelecidos no Mahayana, sendo necessário tomar votos Mahayana e, posteriormente, votos Vajrayana.

O termo Tantra, em sânscrito, pode significar “tratado” ou “exposição”, também pode ser entendido como um continuum de práticas meditativas. É um caminho esotérico com meditações e visualizações profundas para praticantes avançados, não devendo ser banalizados, uma vez que tais visualizações e exercícios respiratórios ativam os canais e chakras do corpo, podendo ser danosos à mente de um praticante sem base adequada e aumentar as suas perturbações mentais.

O uso de imagens de relações sexuais entre deidades masculinas e femininas tem caráter simbólico e representa a união das polaridades dentro de nós. Tais imagens não devem ser tomadas ao pé da letra, nem como um manual de práticas sexuais, como fazem falsos gurus, abusadores e escolas mal intencionadas, nem se deve utilizar de práticas ou relações sexuais (ou "magia sexual") na prática tântrica.

Buston Rinpoche (1290-1364), importante expoente da tradição Jonang-Zhalu, em sua organização do cânone budista indo-tibetano, separou os tantras idôneos (novas traduções) dos não idôneos (velhas traduções/nyingma). Ou seja, separou as práticas e textos adequados e que tinham respaldo em fontes sânscritas daqueles que haviam deturpado os ensinamentos. 


Buston Rinchen Drub (1290-1364)

Texto escrito por Bruno Carlucci, 2016.


Referências sobre os estudos de Buston: 


Roerich, George N. and Gendün Chöphel, translator (1988). The Blue Annals by Gö Lotsawa. Motilal Banarsidass, Delhi, 1976, Reprint in 1979. [reprint of Calcutta, Royal Asiatic Society of Bengal, 1949, in two volumes].


Butön's History of Buddhism in India and Its Spread to Tibet: A Treasury of Priceless Scripture. Tsadra Foundation.